5.10.16

Volta

Volta pra mim, antes que eu esqueça seu cheiro e suas piadas fora de ordem e cronograma. Volta pra mim porque eu preciso sentir vergonha por você, pelas coisas engraçadas que você faz, porque sua intensidade ninguém mais tem; porque seu cheiro ninguém mais tem, porque sua mão tão macia e dura ainda toca em mim quando estou bêbada as 01:16 depois de ter ido de pijama comprar mais bebidas e cigarros pra me afundar no vazio existente, aquele que eu me equipava dentro de tuas saboneteiras tão cheirosas. Aquele vazio que eu me afundava dentro dos teus cabelos crespissímos que eu tanto amo e tanto adoro e tanto devorei nesses meses em que você estava aqui todos os dias. Na minha antiga casa, na minha expulsão, na minha nova casa, nesse colchão da casa nova que ainda, mesmo depois e ainda é cheia de você.
Eu não quero te esquecer, porque te esquecer consiste em reviver, em não ouvir mais minhas músicas preferidas, em não rir tanto, em não gritar quanto a felicidade enchia a minha garganta e só você sabia como criar uma sintonia pra que não ficasse tão esquisito e eu parecesse uma criança pedindo socorro. 
Volta, porque essas noites são cada vez mais silenciosas e não tem sono, não tem filme, não tem animais que tanto amo pra me acalmar quando novamente começo a hiperventilar, assim que minha mão se estica e eu não sinto sua pele alérgica, macia, preta e tão mas tão chamativa. 
Eu não tenho ninguém.
Já deitei aqui, nesse mesmo local onde você dormia tão calmamente, como se a vida fosse tão certa pra nós - com tantos outros. E ninguém tem essa mão, ninguém tem sua sonambulice, ninguém teu seu mau hálito cheiroso, ninguém tem seu cabelo amassado, ninguém existe em você porque você sou eu - naquela parte, lembra? aquele parte que sempre existiu em mim e que você me entregou e pegou e levou e sumiu e me deixou, assim vazia, assim só - coberta dessa água salgada, desse mar, poseidon que não destróiu - só afoga. Eu me afoguei em você mesmo quando você me emergia. Eu me deitei aqui com tantos outros vocês que tentei ajeitar no seu jeito e quando achava que era você e dizia seu nome, eles iam - ou iam ou tentavam me acalmar quando eu gritava: Meu Deus! Vai embora! Não é você e nunca será você!
E chorava e gritava, eu não aguento mais quebrar tudo e comprar novamente as coisas que eram suas, eu joguei tua gaveta fora e sabe aquele buraco? Eu deito nesse buraco e te chamo e te imploro pra que volte, antes que eu morra dentro de mim mesma e nunca mais volte e não me encontre e não me ache e não me veja. Eu não me enxergo mais.
Volta, porque toda vez que visito o Orelha (nosso animal resgatado, lembra?) ele procura você, antes mesmo que eu mesma olhe pro lado achando que você já está preparando aquele sachê gostoso para agradá-lo. Antes mesmo de eu falar pra você não fazer isso porque isso e aquilo e tantos outros e ser ignorada e ele amar, e ele deitar e mostrar pra mim o quanto você foi importante porque ele, assim como eu - nunca amou alguém tanto assim. Nunca quis alguém assim, no passado presente futuro das vidas e outras vidas. 
Volta, porque meus olhos não desincham nunca, porque a dor não acaba nunca, porque a comida está estragando, porque a cama não se dobra mais, porque o Bruce só dorme e não tem você pra lamber. Porque essa casa só te chama, porque a pia entupiu e eu não consigo mais escovar os dentes, porque eu saio deito e durmo, porque a alegria - aquele que embala a continuação da felicidade não vêem mais. 
Eu sai, eu dancei, eu bebi eu bebi eu bebi e bebi e bebi e os gostos estão diferentes, ta tudo tão triste sem você.
Eu queria dizer, antes mesmo de tudo se apagar - que peço perdão, por não ser nada do que sempre te orgulhei em ser - porque todos os porquês não precisam mais de justificativa.
Porque você não volta?

Nenhum comentário:

Postar um comentário